20 janeiro 2016

A Volta de Moisés em Grande Estilo






Com o início da perseguição aos judeus, na segunda guerra mundial, a velha Londres na Inglaterra acolheu com honra o homem que chocou o mundo com suas descobertas, até hoje, motivo de inúmeros trabalhos e releituras.

Fora de sua terra, e já muito debilitado por um câncer, resolveu corajosamente dar o seu último recado: em 1938, contra opiniões contrárias de muitos amigos, trouxe a terra estranha (Inglaterra) um estudo histórico-psicanalítico sobre a religião de Moisés e sua relação com a gênese das neuroses humanas, motivo pelo qual recebeu violentas críticas, principalmente, da ortodoxia religiosa.

Em nota preambular à última parte de “Moisés e o Monoteísmo”, que tinha retido por temer represálias da sociedade vienense a qual pertencia, finalmente conseguiu traduzi-la para o inglês no início de seu exílio em Londres. Assim começou sua fala: “Com a audácia daquele que tem pouco ou nada a perder[…]. (Moisés e o Monoteísmo Edição Standard da Imago página 71)

Ainda hoje, o fascínio pela odisseia do fundador do povo hebreu continua a ferver nos corações dos religiosos, principalmente no Brasil.

O bispo, Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus, com a trilogia de maior tiragem, “Nada a Perder”, sem querer, parafraseou, Freud, que no esboço preliminar de seu Moisés, se sentia audacioso, com pouco ou nada a perder.

Os dez Mandamentos” da Record Filmes (Vide Link)), segundo a reportagem de Thiago Prado à revista Veja desta semana, sob o título “Irás ao Cinema”(adotado como o décimo primeiro mandamento), em sua pré-venda, já atingiu 1,5 milhão de ingressos vendidos. Para a Igreja Universal, sua grandiosa película vai bater o recorde de Tropa de Elite que em 2010 teve 11 milhões de espectadores.

O leite e o mel eram o que havia de mais precioso na terra de Canaã, e o que mais atraía o líder Moisés e seus liderados. Não sei, mas talvez a maior alegria ou a maior vitória do líder da Universal e seus fiéis, ocorrerá quando um Moisés bem estiloso adentrar as 1.000 salas de cinemas do Brasil no dia 28 deste mês, e permanecer em cartaz por muito tempo. Não deixem para a última hora, adquiram logo seu ingresso, para não sofrer transtornos em enormes filas.

Para Freud, o Judeu circuncidado uma semana após o nascimento (como registra a Bíblia de Jacob, seu pai) a religião de Moisés nada mais era que uma versão do monoteísmo do Faraó Akhenaton, trazido do Egito. Mas Jung, o discípulo rebelde, rompeu com seu mestre, Freud, ao pressentir que nas diversas formas de religião existiam representações psíquicas primitivas que as denominou “Arquétipos”.

Freud considerava a religião a repetição de uma experiência infantil. Por esse filão freudiano é de se supor que muitos adultos comparecerão às salas de cinema do país. Existe coisa melhor de que se sentir criança de novo? Por acaso não foi na nossa infância que desejos poderosos e irreprimíveis nos levaram ao mundo imaginário das aventuras vitoriosas de reis, deuses, heróis, grandes gladiadores e outros ídolos que agora não me passam pela memória.

Na perspectiva de Carl G. Jung, “nossa mentalidade moderna olha com desdém as trevas da superstição e credulidade medieval ou primitiva, esquecendo-se por completo de que carregamos em nós, todo o passado, escondido nos desvãos dos arranha-céus da nossa consciência” [Psicologia e Religião – Editora Vozes – página 40]

O Bispo não é tolo: com Freud ou com Jung, a bilheteria estará garantida.

Em Freud, conferir o filme “Os Dez Mandamentos” seria o mesmo que experimentar o prazer (ilusão) de voltar a ser criança, identificando-se com deuses, heróis e até vilões, pelo mecanismo de regressão.

Em Jung, assistir “Os Dez Mandamentos” é se deixar levar pelo prazer de uma fascinante viagem à pré-história humana. É reviver, enfim o mito das aventuras de deuses, heróis, e vilões que, aparentemente esquecidos, emanam dos arquivos secretos do inconsciente coletivo.

Uma coisa é certa: daqui a oito dias, o bispo da Universal transformará as mil salas de cinemas de todo o país em verdadeiras catedrais, onde Javeh e um estiloso Moisés, aparecerão em toda sua grandeza épica. O "Irás à Catedral", em substituição ao décimo primeiro mandamento, “Irás ao Cinema”, título da reportagem de Thiago Prado, viria a calhar com o pensamento de um dos maiores expoentes da Mitologia, Joseph Campbell, que comparava as salas de exibições a templos especiais. Em seu antológico livro, “O Poder do Mito”, chegou assim a se expressar:

Ao entrar numa catedral você penetra num mundo de imagens espirituais que têm formas humanas. Nas cavernas as imagens têm forma animal. Mas é a mesma coisa. A forma é secundária. A mensagem é que importa.


  Por Levi B. Santos
Guarabira, 20 de janeiro de 2016

Site da Imagem: porttalpopcorn.com.br

3 comentários:

RODRIGO PHANARDZIS ANCORA DA LUZ disse...

Curioso que, quando a IURD começou no Rio de Janeiro, lá pelo final dos anos 70 e começo da década de 80, eles compraram inúmeros cinemas de rua e os transformaram em igrejas. Bem, se Freud não explicar, Jung esclarece... (rsrsrs)

Quanto ao filme, confesso que tenho preconceito quanto a essa produção, a qual deve contar como público os frequentadores da seita e outros evangélicos pentecostais que acabam se deixando levar pelo marketing religioso dos pastores midiáticos. Já a classe média culta não deve dar importância à produção.

Na época da infância, assisti Os Dez Mandamentos, o qual certamente deve ter sido reprisado muitas vezes pela TV brasileira, tratando-se de um filme épico norte-americano de 1956 dirigido por Cecil B. DeMille.

Levi Bronzeado dos Santos disse...


Acho que a comunidade judaica é quem mais vai gostar da reedição macediana da epopeia de Moisés . Não custa lembrar aqui, o elogio ou afago que Claudio Luiz Lottenberg, presidente da Congregação Israelita no Brasil, segundo os órgãos de imprensa da Universal, fez., por ocasião da cerimônia de inauguração da réplica do Templo de Salomão em São Paulo:

: "Acho que é um marco para o mundo. Isso vai agregar muito em termos de turistas para o País, pessoas  que vêm para cá. Acho algo absolutamente irretocável." — afirmou ele

Segundo o noticiário da Record, até o embaixador de Israel no Brasil, Rafael Eldad, e o ministro de Israel Lior Ben Dor, que estiveram na inauguração do Templo de Salomão (com capacidade para 10.000 pessoas sentadas), ficaram sensibilizados com tamanha homenagem da Universal a Deus e ao povo de Israel.

Não sei como vai se comportar a comunidade muçulmana do Brasil, também pertencente ao mesmo Javeh. (rsrs)

RODRIGO PHANARDZIS ANCORA DA LUZ disse...

Conheço muitos judeus que criticam a IURD e essas seitas neo-pentecostais. Inclusive, a novela que passou na Record obteve muitos comentários negativos nas diversas tendências do Judaísmo.

Entretanto, a comunidade judaica também age por conveniência na proteção de seus interesses. E aí as posições de várias dessas igrejas neo-pentecostais, principalmente se não reivindicam ser "judeus messiânicos", estabelecem uma excelente ponte com os interesses políticos sionistas. Não só em relação ao turismo mas também quanto ao próprio Estado de Israel que encontra nesses grupos cristãos um ambiente ideológico favorável, coisa que o PT não oferece. Aliás, o governo do Brasil anda meio que em crise com Israel...

Fato é que os judeus não gostam de se misturar, mas se aliam. Nisso são inteligentes e estratégicos só que, infelizmente, é uma direita quase extremada quem tem comandado o Estado de Israel. Muito triste!

Sobre a comunidade muçulmana, embora Moisés conste nas suras do Corão, não se trata de um personagem com a mesma importância para o Islã como o patriarca Abraão. Este sim comum para as três maiores religiões monoteístas do planeta. Na opinião de inúmeros muçulmanos, os judeus teriam alterado a Torá e por aí vai de modo que o teor do Pentateuco cristão deve também ser alvo de controvérsias teológicas entre os grupos islâmicos.

De qualquer modo, quero acreditar que existam judeus e muçulmanos fora de suas respectivas gaiolas...