06 setembro 2011

“Castigo Divino” — Combustível da Política Ocidental


Não tenho dúvida de que o desejo de todo “poder político” do mundo ocidental tem como base um deus talhado segundo os anseios humanos. O essencial aqui é mais a profundeza de uma inconsciência que, a partir da impressão de um deus intolerante, faz o homem revelar-se a si mesmo.

A destruição das Torres Gêmeas nos EUA, que esta semana completa dez anos, ainda emite ecos ou ressonâncias do inconsciente coletivo religioso do tempo das leis Mosaicas.

Segundo grande parte do mundo muçulmano, essa catástrofe foi resultado de uma intervenção de Alá, contra os pecadores americanos. Segundo Bush, ex-presidente dos EUA, tudo foi obra de Satã (que mora do lado de lá) para amedrontar o povo cristão que nos EUA tem o seu maior centro.

Mas há algo mais profundo por trás de todo este contexto de destruição do mal pelos deuses; algo mais maléfico, que é o uso das hecatombes e tragédias para fins político-eleitoreiros.

Note-se que existe sempre uma correlação estreita entre o ato de “satanizar” e o de “divinizar”. Afinal, a “divindade” se enriquece daquilo que o homem inconscientemente projeta sobre o outro, seu inimigo.

Esta semana, o “modus operandi à la Javé” foi exercitado por nada mais e nada menos que a pré-candidata à presidência dos EUA — Michele Bachmann, ao interpretar o terremoto e o furacão que, recentemente, atingiram a Costa Leste desse país, como um aviso de Deus aos americanos.

Disse ela, na velha e corriqueira linguagem do discurso neo-pentecostal:

“Não sei o que Deus deve fazer para chamar a atenção dos políticos. Tivemos um terremoto, tivemos um furacão. Ele está dizendo: vão começar a me escutar?”

Política e Religião aqui se entrelaçam para manter a sua dominação psicológica sobre as pessoas. Não existe maior filão para ser explorado pelos governantes, do que o de se valer dos fenômenos trágicos para atiçar o medo e a consequente agressividade entre grupos religiosos/políticos rivais.

Não são poucos os pastores fundamentalistas nos EUA que alcançaram êxito político ao invadir os meios de comunicação para doutrinar a população americana (os eleitores) na luta contra o “Império do Mal”.

A Michele Bachmann, nesse mês (setembro de 2011) em que a nação rememora as perdas de quase 3.000 vidas, nada fez senão o papel de uma pré-candidata “Cristã” à Presidência dos EUA, apoiada talvez pelos crentes fundamentalistas novos e velhos, e os endinheirados pastores da linha dura Javeliana.

Nesse momento, para gáudio dos americanos feridos em sua auto-estima, não havia presente maior do “deus dos exércitos americanos”, do que esse: a deposição recente do sanguinário Muammar Kadhafi, da Líbia. Não importa, para os soldados de Obama, que o substituto do ditador Líbio seja um outro sanguinário ao estilo “democrata-cristão”. O que importa, por enquanto, é ver a maior nação cristã do planeta (com seu deus Javé), se sentir vingada dos estragos causados pelo exército inimigo do general Alá.

Quanto a Cristo, personagem secundário, e portador da mensagem do “se alguém te bater no rosto, ofereça a outra face”, deixa pra lá...


Por Levi B. Santos

Guarabira, 06 de setembro de 2011

Site da imagem: livrepensar.wordpress.com

3 comentários:

Eduardo Medeiros disse...

levi, antes de ler esta postagem, quero dizer que li seu texto de 2007 sobre o seu mestre barítono que lhe fez gostar da música.

senti uma grande emoção pois a letra do hino que você cita, era um dos favoritos da minha mãe desde que eu me entendo por gente. cresci ouvindo-a cantar essa triste melodia mas de uma letra poeticamente bela.

minhas memórias afetivas musicais então começaram a me mandar hinos antigos que na voz da minha mãe ficavam tão belos para mim...

desculpe, meu amigo, mas perdi completamente, por hora, a vontade de comentar este texto o "deus guerreiro dos americanos"

Donizete disse...

"Só Javé é Deus". Assim bradou os seguidores de Elias no monte Carmelo após a morte de 850 profetas de Baal.
O que ocorre hoje é uma nova edição em maior escala das batalhas dos deuses descritas em grande número no AT. A subjugação do deus oriental, representado pelas redes terroristas, é a prova que javé ganhou mais uma queda de braço, bem ao estilo primitivo de interpretar Deus.
É quase inacreditável que uma população tão secularizada quase indiferente as realidades espirituais se apeguem à estas crendices milenares, de um deus que entra nas guerras provocadas pela insanidade humana.
Vemos o reflexo desse conceito em cultos evangélicos. O pregador efusivamente grita: Davi cortou o pescoço de Golias. O povo responde: ALELUIA! Samuel pegou na barba de agague e o apunhalou com um golpe certeiro no coração. O povo diz: GLÓRIA A DEUS! Afinal era um inimigo de Deus. Um anjo numa só noite dizimou 185 mil soldados assírios. O povo não consegue conter-se; Pula, grita, exaltando o nome do “senhor” por tão grande feito.
Esta é imagem distorcida, que muitos, de forma inconseqüente fazem, e pior, transmitem a cerca do verdadeiro Deus cristão.

Um abraço.

RODRIGO PHANARDZIS ANCORA DA LUZ disse...

A satanização do adversário (ou daquele que não está de acordo com a ideia de um grupo) teve suas origens políticas.

A primeira vez que o termo satã apareece na Bíblia nem tinha a ver com o diabo, Satanás. Foi um mero termo aplicado ao Anjo do SENHOR que se opôs a Balaão em seu caminho. Logo, o satã era só um opositor. Só no exílio babilônico, por uma possível influência do dualismo persa, é que surge a ideia de um anjo mal que se opõe a Deus - Satanás.

Porém, nos séculos que antecederam á era cristã, o termo satã já era aplicado aos adversários dentro da sociedade judaica. Quando não havia concordância de um grupo em relação ao outro, satanizava-se os dissidentes ou quam estava no poder. E, com o cristianismo, fez-se o mesmo em relação aos irmãos que se afastavam da ortodoxia.

Hoje não é muito diferente. Não apenas cristãos e árabes satanizam-se uns aos outros, como se vê prática semelhante dentro da própria sociedade ocidental no âmbito interno. Dizer que fulano pode ser o anticristo ou que o outro político tem pacto com o demônio são estratégias usadas de maneira perversa ainda que com terminologias diferentes e direcionadas para um discurso aparentemente mais racional. Se bem que racionalidade é o que mais falta em caras como Bush ou Saddam e agora nesta nova candidata norte-americana.